Etapa 6A – Relatório 1


Quênia.NOV.2004

Jambo amigos, Aterrisei na África e recomecei a pedalada em Mombasa no Quênia.


Precisei de um tempo para passar o choque de sair da Europa e vir diretamente para cá. O país é quente e muito muito pobre. Passado o susto dos primeiros dias segui pedalando para o sul pelo litoral.
Um pouco sobre o Quênia…

“No Séc VIII os árabes estabeleceram colônias no litoral do país.

Os portugueses chegaram no Séc. XVI, destruíram as cidades e arruinaram várias tribos.

Em 1698 os portugueses foram forçados a sair do país e deixaram para trás seus fortes abandonados e uma economia em ruína, condição que deu continuidade ao comércio de marfim e escravos em Zanzibar.

No final do Séc. XIX um grupo germânico-britânico decidiu executar uma linha de trem ligando Uganda e a costa. Vieram trabalhadores indianos e com eles a epidemia smallpox que matou metade da população local.

Em 1884 Africa foi dividia em 48 estados pelos europeus na Conferência de Berlim. “As divisões políticas dos países não respeitaram as culturas locais ou as realidades geopolíticas daquele tempo: muitas comunidades foram divididas e outras, diferentes e muitas vezes antigas inimigas, foram colocadas juntas para atender às necessidades da nova era européia.

Em 1948, 4200 km2 de aproximadamente 5000 km2 de áreas férteis estavam nas mãos de 5000 europeus, enquanto um milhão de Kikuyu (um dos maiores grupos nativos) ocupavam pouco mais de 1000 km2. Não existiu nenhuma indenização ou compensação para esse roubo.

Na costa a maioria da população é muçulmana mas no média do país eles representam apenas 6% enquanto 73% é cristã e 20% pratica religiões tradicionais locais.

Apenas 17.2% do terreno queniano é fértil e hoje é ocupado por mais de 80% da população.”

The New Internationalist

A sociedade é tribal e quase todos falam o suaíle e o inglês. “Nossa diversidade nos leva a desafios linguísticos. Por isso temos uma nação onde no mínimo 30 por cento de seus habitantes não consegue comunicar em nenhum idioma.”

Comentário no jornal the Nation nov-2004

A história de praticamente toda a África é marcada por desgraças e a situação hoje não é muito diferente.

Sinuca em Mombassa

Cinema em Mombassa
Saida do ferry para a ilha de Mombassa

A COLONIZAÇÃO CONTINUA

O europeu gasta, o indiano gerencia e o queniano trabalha.

Para quê colonizar se é possível apenas explorar?

A teoria é simples e funciona em praticamente todo terceiro mundo. Ao invés de chamar o país de colônia, apenas exploram sua mão de obra barata e seus recursos… sem a necessidade de fincar uma bandeira no orgulho de ninguém. É uma releitura da colonização em que as estratégias mudam mas a situação social continua igual. A independência nunca existiu. Desde a chegada dos colonizadores, os habitantes nativos perderam o controle econômico-político do próprio país e até hoje seguem dependentes e explorados.

O turismo no Quênia é um exemplo. Essa indústria é a maior provedora de divisas do país mas essas divisas vêm de fora e vão para fora. Em uma das praias que visitei, os donos de hotéis cuja diária custa 300 dólares são indianos, o dono do bar-prostituição é um alemão e os quenianos são os garçons, prostitutas ou, quando muito empreendedores, camelôs ou donos do restaurante barato.

A diferença social entre os turistas, maioria europeu, e o povo é gritante. Para conterem a pressão social gerada, fizeram uma espécie de “cidade medieval”. Do lado de dentro da “muralha” estão os safaris, os hotéis cinco estrelas, os melhores restaurantes e as melhores localizações do país. Do lado de fora está o povo miserável sem trabalho e sem comida.

O governo é corrupto e, segundo me disseram , possui acordos com os indianos que privatizam as praias com hotéis. Além da ilegalidade da privatização, o governo também disponibiliza a polícia para fazer a “limpeza da praia” com o “bota-fora” dos quenianos todos os dias às 18:00.

“Eles nos fazem prisioneiros no nosso próprio país. É o sistema babilônico” me falou o amigo queniano Shilingi em Mombasa, indignado com a situação.

Por exemplo a praia de Shanzu é hoje um grupo de hotéis que privatizaram o seu acesso. Os hotéis construíram uma fortaleza paradisíaca com imensos gramados entre coqueiros, várias piscinas, restaurantes de primeira linha e vistas magníficas do mar. Um paraíso para quem pode gastar. Um lugar onde todo branco é bem vindo e todo negro precisa se identificar. Entrei em vários desses hotéis para tirar fotos e vi todos os brancos desfrutando e os negros trabalhando. A triste submissão é infelizmente a única alternativa de renda da população local. Além do desgosto da situação ainda tive a infelicidade de escutar o comentário de um grupo europeu – A praia é linda, pena que tem tanto negro.

É uma sitação tão ruim que é realmente difícil de imaginar alguma solução viável. Principalmente com a imensa corrupção do país. A palavra corrupção foi inventada na África, bem aprendida na América do Sul e atualmente utilizada em todo o mundo. Quênia ocupa a quinta colocação no ranking mundial do Global Corruption Report 2001, Transparency International Web site. Junto com a corrupção vem também muita burocracia e um governo centralizado. Mas o problema não está somente no governo, faz parte da mentalidade de quase todos e atrapalha muito o desenvolvimento e a necessária melhoria de vida dos quenianos.

NAIROBI

Amigos Eric e Bonny em Nairobi

Amigos de Nairobi

Shoe shine

Aterrisei na capital e fui direto para a casa de amigos que conhecia apenas por email. Imaginei que era uma família convencional mas era um grupo de jovens que resolveram dividir a casa, fazer uma comunidade – os Hoggz family – e convidar viajantes para dividirem um pouco a vida comum dos quenianos. Segundo eles, todos vão para a África para ver animais selvagens e se esquecem de conhecer o povo. Valeu pela hospedagem Hoggz!

Andando pelo centro a minha cor destoava do resto da população totalmente negra. O fato deu ser (mais ou menos) branco me inclui automaticamente no paradigma do rico europeu. Isso me perturba um pouco pois poucos aqui entendem a diferença entre América do Sul e Europa. Mesmo eu explicando que sou um brasileiro na maior perrengue viajando de bicicleta, continuavam insistindo em negociar hotéis, safaris, massagem, drogas, etc.

Nairobi é uma cidade perigosa. Possui muito desemprego e miséria. De noite nem os moradores locais andam nas ruas e de dia é preciso ficar muito esperto com tudo. Mal cheguei e já fui assaltado três vezes. Não foram exatamente assaltos mas golpes de malandros que eu sinto até vergonha de ter caído, mas caí. Tive papo furado de refugiado, polícia, governo, cambista, alfândega, asSALTO Massai, etc.

A grana que perdi foi o preço do “Safari Social” que estou fazendo. Para estar mais seguro eu poderia me proteger no mundo encantado dos hotéis de luxo mas seguramente essa Disneylandia para europeus está muito longe do real Quênia que vim visitar. Eu vim aqui para ver um pouco da África, europeu eu já vi na Europa.

Depois do susto dos primeiros golpes continuei a viagem mais cauteloso. Como medidas práticas de segurança, parei de me barbear e lavar as roupas. Logo estarei praticamente um monstro nômade. A bicicleta também ganhou um novo visual, agora estou pedalando numa bikefavela cheia de plásticos velhos nos alforges.

De Nairobi fui de ônibus para Mombasa de onde comecei a pedalada africana.

MOMBASSA

Shanzu Beach
Vendendo tecidos
Vista de um dos hoteis de luxo da regiao

Mombasa é a segunda maior cidade do país com um porto histórico ocupado por praticamente todas as civilizações que estiveram por aqui.

Passei alguns dias na praia em Mombasa refletindo sobre o caminho a seguir. A primeira opção foi cruzar o país pedalando até o lago Vitória. Com essa idéia na cabeça comecei a ver as fotos dos animais selvagens com outros olhos. Precisaria cruzar as reservas naturais do país com leões, elefantes, girafas, rinocerontes, leopardos, etc. Interessante mas também assustador.

Surgiu um Masai na praia que se interessou em viajar comigo até a tribo dele no meio do meu percurso. Perfeito – ninguém melhor para atravessar a selva africana com você do que um morador local.

O asSALTO DOS MASSAI

Danca Massai

No restaurante com os amigos massai

Massais Lelelit e Lekuchulah em Mombassa

Os Massai são famosos pelas suas roupas vermelhas, bijouterias coloridas e altos saltos durante as danças. Vivem originalmente nas savanas mas, por causa do turismo, parte da tribo se moveu para a praia e vive da venda de souveniers, fotos, apresentações, etc. Vi apenas homens e segundo eles as mulheres não podem ir para a praia porque não são “guerreiras”. Todos já mataram um leão (haja leão!) e possuem celular e email.

O sangue árabe fez dos Massais bons negociantes. O amigo Massai conseguiu de uma forma engenhosa, depois de três dias de muito papo furado, me convencer a emprestar-lhe dinheiro para comprar uma bicicleta. No outro dia ele me apareceu dizendo que foi roubado.

Eu pressenti o golpe mas achei que valeu a pena arriscar. Ficaria com a consciência pesada de pensar que, por causa de dinheiro, eu deixaria no caminho alguém sonhando em viajar de bicicleta comigo.

Um pouco decepcionado e assustado com a quantidade de golpes que recebi em tão pouco tempo, mudei de percurso e segui sozinho pedalando rumo sul pelo litoral do Quênia.

A maioria da população costeira é Mijikenda , uma união de nove diferentes tribos. “Eles (pessoas da geração antiga dos Mijikenda ) acreditam que ser rico não está relacionado ao dinheiro e sim à quantidade de mulheres e crianças que possuem. Meu pai possui quatro mulheres e dezesseis filhos. Felizmente eu sou o filho mais velho da primeira mulher e por isso toda família deve me respeitar.” me contou o amigo Iha, 20 anos, da tribo Giriama (uma das tribos Mijikenda ). Todos da nova geração que conversei são conscientes da necessidade de controle de natalidade e me disseram que pretendem ter apenas 2 ou 3 filhos.

A influência árabe é muito forte em toda a costa. Em Mombassa as mesquitas são cheias de vida e luz e mais de 70% da população é muçulmana. Por causa das rotas marítimas com a Índia e Europa, ali também encontrei hindus e cristãos.

CONTINENTE IRMÃO

Mercado em Mombassa

Raphael fa do Brasil< Futebol nos fundos do Forte Jesus em Mombassa

Isso aqui oô é um pouquinho de Brasil iaiá.

O clima tropical traz muitas semelhanças.

Aqui estou comendo manga, coco, mamão, banana, arroz com feijão… vejo futebol na rua e também muita malandragem.

Durante a colonização portuguesa, vários barcos negreiros partiram daqui para o Brasil. Junto com eles foi também muito da cultura africana que é hoje uma das bases da cultura brasileira.

A saudade e proximidade do Brasil está ficando cada vez maior!

De Mombasa atravessei a fronteira e agora estou na Tanzânia que ficará para o próximo relatório.

Grande abraço,

Argus

Ugali

comendo no mercado aberto de Mombassa
Vila perto de Mombassa

– Jambo.

– Jambo bwana.

– Habari ngani ?

– Mzuri sana.

– Kenya yetu.

– Hakuna matata…

– Wangeni wote mwakaribishwa.

– Kenya inchi zuri.

– Hakuna matata.

– Ôu.

– Ôu sô.

– Bão ?

– Bão sô.

– Eita Quênia.

– Problema não…

– Todo mundo pode vir.

– Quênia é bonita demais.

– Problema não.
– Hello.

– Hello mister.

– How are you?

– It´s ok.

– My Kenya.

– No problem…

– All visitors are welcome.

– Kenya is a beautiful country.

– No problem…

Para saber mais:

Site oficial dos Parques Nacionais do Quênia

www.kws.org

Sites sobre prostituição e dicas para conduta dos turistas:

www.thecode.org

www.world-tourism.org

www.ecpat.org ou www.ecpat.com

Outros

http://web.amnesty.org

Precisei de um tempo para passar o choque de sair da Europa e vir diretamente para cá. O país é quente e muito muito pobre. Passado o susto dos primeiros dias segui pedalando para o sul pelo litoral.

Um pouco sobre o Quênia…

“No Séc VIII os árabes estabeleceram colônias no litoral do país.

Os portugueses chegaram no Séc. XVI, destruíram as cidades e arruinaram várias tribos.

Em 1698 os portugueses foram forçados a sair do país e deixaram para trás seus fortes abandonados e uma economia em ruína, condição que deu continuidade ao comércio de marfim e escravos em Zanzibar.

No final do Séc. XIX um grupo germânico-britânico decidiu executar uma linha de trem ligando Uganda e a costa. Vieram trabalhadores indianos e com eles a epidemia smallpox que matou metade da população local.

Em 1884 Africa foi dividia em 48 estados pelos europeus na Conferência de Berlim. “As divisões políticas dos países não respeitaram as culturas locais ou as realidades geopolíticas daquele tempo: muitas comunidades foram divididas e outras, diferentes e muitas vezes antigas inimigas, foram colocadas juntas para atender às necessidades da nova era européia.

Em 1948, 4200 km2 de aproximadamente 5000 km2 de áreas férteis estavam nas mãos de 5000 europeus, enquanto um milhão de Kikuyu (um dos maiores grupos nativos) ocupavam pouco mais de 1000 km2. Não existiu nenhuma indenização ou compensação para esse roubo.

Na costa a maioria da população é muçulmana mas no média do país eles representam apenas 6% enquanto 73% é cristã e 20% pratica religiões tradicionais locais.

Apenas 17.2% do terreno queniano é fértil e hoje é ocupado por mais de 80% da população.”

The New Internationalist

A sociedade é tribal e quase todos falam o suaíle e o inglês. “Nossa diversidade nos leva a desafios linguísticos. Por isso temos uma nação onde no mínimo 30 por cento de seus habitantes não consegue comunicar em nenhum idioma.”

Comentário no jornal the Nation nov-2004

A história de praticamente toda a África é marcada por desgraças e a situação hoje não é muito diferente.
Sinuca em Mombassa Cinema em Mombassa Saida do ferry para a ilha de Mombassa

A COLONIZAÇÃO CONTINUA

O europeu gasta, o indiano gerencia e o queniano trabalha.

Para quê colonizar se é possível apenas explorar?

A teoria é simples e funciona em praticamente todo terceiro mundo. Ao invés de chamar o país de colônia, apenas exploram sua mão de obra barata e seus recursos… sem a necessidade de fincar uma bandeira no orgulho de ninguém. É uma releitura da colonização em que as estratégias mudam mas a situação social continua igual. A independência nunca existiu. Desde a chegada dos colonizadores, os habitantes nativos perderam o controle econômico-político do próprio país e até hoje seguem dependentes e explorados.

O turismo no Quênia é um exemplo. Essa indústria é a maior provedora de divisas do país mas essas divisas vêm de fora e vão para fora. Em uma das praias que visitei, os donos de hotéis cuja diária custa 300 dólares são indianos, o dono do bar-prostituição é um alemão e os quenianos são os garçons, prostitutas ou, quando muito empreendedores, camelôs ou donos do restaurante barato.

A diferença social entre os turistas, maioria europeu, e o povo é gritante. Para conterem a pressão social gerada, fizeram uma espécie de “cidade medieval”. Do lado de dentro da “muralha” estão os safaris, os hotéis cinco estrelas, os melhores restaurantes e as melhores localizações do país. Do lado de fora está o povo miserável sem trabalho e sem comida.

O governo é corrupto e, segundo me disseram , possui acordos com os indianos que privatizam as praias com hotéis. Além da ilegalidade da privatização, o governo também disponibiliza a polícia para fazer a “limpeza da praia” com o “bota-fora” dos quenianos todos os dias às 18:00.

“Eles nos fazem prisioneiros no nosso próprio país. É o sistema babilônico” me falou o amigo queniano Shilingi em Mombasa, indignado com a situação.

Por exemplo a praia de Shanzu é hoje um grupo de hotéis que privatizaram o seu acesso. Os hotéis construíram uma fortaleza paradisíaca com imensos gramados entre coqueiros, várias piscinas, restaurantes de primeira linha e vistas magníficas do mar. Um paraíso para quem pode gastar. Um lugar onde todo branco é bem vindo e todo negro precisa se identificar. Entrei em vários desses hotéis para tirar fotos e vi todos os brancos desfrutando e os negros trabalhando. A triste submissão é infelizmente a única alternativa de renda da população local. Além do desgosto da situação ainda tive a infelicidade de escutar o comentário de um grupo europeu – A praia é linda, pena que tem tanto negro.

É uma sitação tão ruim que é realmente difícil de imaginar alguma solução viável. Principalmente com a imensa corrupção do país. A palavra corrupção foi inventada na África, bem aprendida na América do Sul e atualmente utilizada em todo o mundo. Quênia ocupa a quinta colocação no ranking mundial do Global Corruption Report 2001, Transparency International Web site. Junto com a corrupção vem também muita burocracia e um governo centralizado. Mas o problema não está somente no governo, faz parte da mentalidade de quase todos e atrapalha muito o desenvolvimento e a necessária melhoria de vida dos quenianos.
NAIROBI
Amigos Eric e Bonny em Nairobi Amigos de Nairobi Shoe shine

Aterrisei na capital e fui direto para a casa de amigos que conhecia apenas por email. Imaginei que era uma família convencional mas era um grupo de jovens que resolveram dividir a casa, fazer uma comunidade – os Hoggz family – e convidar viajantes para dividirem um pouco a vida comum dos quenianos. Segundo eles, todos vão para a África para ver animais selvagens e se esquecem de conhecer o povo. Valeu pela hospedagem Hoggz!

Andando pelo centro a minha cor destoava do resto da população totalmente negra. O fato deu ser (mais ou menos) branco me inclui automaticamente no paradigma do rico europeu. Isso me perturba um pouco pois poucos aqui entendem a diferença entre América do Sul e Europa. Mesmo eu explicando que sou um brasileiro na maior perrengue viajando de bicicleta, continuavam insistindo em negociar hotéis, safaris, massagem, drogas, etc.

Nairobi é uma cidade perigosa. Possui muito desemprego e miséria. De noite nem os moradores locais andam nas ruas e de dia é preciso ficar muito esperto com tudo. Mal cheguei e já fui assaltado três vezes. Não foram exatamente assaltos mas golpes de malandros que eu sinto até vergonha de ter caído, mas caí. Tive papo furado de refugiado, polícia, governo, cambista, alfândega, asSALTO Massai, etc.

A grana que perdi foi o preço do “Safari Social” que estou fazendo. Para estar mais seguro eu poderia me proteger no mundo encantado dos hotéis de luxo mas seguramente essa Disneylandia para europeus está muito longe do real Quênia que vim visitar. Eu vim aqui para ver um pouco da África, europeu eu já vi na Europa.

Depois do susto dos primeiros golpes continuei a viagem mais cauteloso. Como medidas práticas de segurança, parei de me barbear e lavar as roupas. Logo estarei praticamente um monstro nômade. A bicicleta também ganhou um novo visual, agora estou pedalando numa bikefavela cheia de plásticos velhos nos alforges.

De Nairobi fui de ônibus para Mombasa de onde comecei a pedalada africana.
MOMBASSA
Shanzu Beach Vendendo tecidos Vista de um dos hoteis de luxo da regiao

Mombasa é a segunda maior cidade do país com um porto histórico ocupado por praticamente todas as civilizações que estiveram por aqui.

Passei alguns dias na praia em Mombasa refletindo sobre o caminho a seguir. A primeira opção foi cruzar o país pedalando até o lago Vitória. Com essa idéia na cabeça comecei a ver as fotos dos animais selvagens com outros olhos. Precisaria cruzar as reservas naturais do país com leões, elefantes, girafas, rinocerontes, leopardos, etc. Interessante mas também assustador.

Surgiu um Masai na praia que se interessou em viajar comigo até a tribo dele no meio do meu percurso. Perfeito – ninguém melhor para atravessar a selva africana com você do que um morador local.

O asSALTO DOS MASSAI
Danca Massai No restaurante com os amigos massai Massais Lelelit e Lekuchulah em Mombassa

Os Massai são famosos pelas suas roupas vermelhas, bijouterias coloridas e altos saltos durante as danças. Vivem originalmente nas savanas mas, por causa do turismo, parte da tribo se moveu para a praia e vive da venda de souveniers, fotos, apresentações, etc. Vi apenas homens e segundo eles as mulheres não podem ir para a praia porque não são “guerreiras”. Todos já mataram um leão (haja leão!) e possuem celular e email.

O sangue árabe fez dos Massais bons negociantes. O amigo Massai conseguiu de uma forma engenhosa, depois de três dias de muito papo furado, me convencer a emprestar-lhe dinheiro para comprar uma bicicleta. No outro dia ele me apareceu dizendo que foi roubado.

Eu pressenti o golpe mas achei que valeu a pena arriscar. Ficaria com a consciência pesada de pensar que, por causa de dinheiro, eu deixaria no caminho alguém sonhando em viajar de bicicleta comigo.

Um pouco decepcionado e assustado com a quantidade de golpes que recebi em tão pouco tempo, mudei de percurso e segui sozinho pedalando rumo sul pelo litoral do Quênia.
O LITORAL

A maioria da população costeira é Mijikenda , uma união de nove diferentes tribos. “Eles (pessoas da geração antiga dos Mijikenda ) acreditam que ser rico não está relacionado ao dinheiro e sim à quantidade de mulheres e crianças que possuem. Meu pai possui quatro mulheres e dezesseis filhos. Felizmente eu sou o filho mais velho da primeira mulher e por isso toda família deve me respeitar.” me contou o amigo Iha, 20 anos, da tribo Giriama (uma das tribos Mijikenda ). Todos da nova geração que conversei são conscientes da necessidade de controle de natalidade e me disseram que pretendem ter apenas 2 ou 3 filhos.

A influência árabe é muito forte em toda a costa. Em Mombassa as mesquitas são cheias de vida e luz e mais de 70% da população é muçulmana. Por causa das rotas marítimas com a Índia e Europa, ali também encontrei hindus e cristãos.
CONTINENTE IRMÃO
Mercado em Mombassa Raphael fa do Brasil Futebol nos fundos do Forte Jesus em Mombassa

Isso aqui oô é um pouquinho de Brasil iaiá.

O clima tropical traz muitas semelhanças.

Aqui estou comendo manga, coco, mamão, banana, arroz com feijão… vejo futebol na rua e também muita malandragem.

Durante a colonização portuguesa, vários barcos negreiros partiram daqui para o Brasil. Junto com eles foi também muito da cultura africana que é hoje uma das bases da cultura brasileira.

A saudade e proximidade do Brasil está ficando cada vez maior!

De Mombasa atravessei a fronteira e agora estou na Tanzânia que ficará para o próximo relatório.

Grande abraço,
Argus

Ugali comendo no mercado aberto de Mombassa Vila perto de Mombassa
– Jambo.
– Jambo bwana.
– Habari ngani ?
– Mzuri sana.
– Kenya yetu.
– Hakuna matata…
– Wangeni wote mwakaribishwa.
– Kenya inchi zuri.
– Hakuna matata.
– Ôu.
– Ôu sô.
– Bão ?
– Bão sô.
– Eita Quênia.
– Problema não…
– Todo mundo pode vir.
– Quênia é bonita demais.
– Problema não.
– Hello.
– Hello mister.
– How are you?
– It´s ok.
– My Kenya.
– No problem…
– All visitors are welcome.
– Kenya is a beautiful country.
– No problem…

Para saber mais
Site oficial dos Parques Nacionais do Quênia
www.kws.org
Sites sobre prostituição e dicas para conduta dos turistas:
www.thecode.org
www.world-tourism.org
www.ecpat.org ou www.ecpat.com
Outros
http://web.amnesty.org